Não há nada que me incomode mais numa história do que eu adivinhar o que vai acontecer. Detesto coisas previsíveis. Sabe aqueles filmes ou quadrinhos em que o protagonista se encontra numa situação complicadíssima, uma encrenca feia, correndo risco de morrer… e aí acorda?
Ou então aquele personagem com óculos fundo de garrafa e várias canetas no bolso da camisa, geralmente abotoada até o pescoço?
Senhoritas e senhoritos, apresento-lhes a dupla Clichê e Estereótipo!
O que é clichê?
O significado original de clichê vem da imprensa. Antes que os computadores passassem a ser utilizados na produção de qualquer tipo de texto, os profissionais usavam placas metálicas com palavras de um texto e/ou imagens em relevo; esse material, tão logo organizado, era impresso em papel. Era usado várias vezes. Daí para clichê passar a significar “coisa repetitiva”, “lugar comum” ou “chavão” não precisou muito.
O exemplo citado, do personagem que acorda e percebe que “tudo não passou de um sonho”, é invenção do autor britânico Lewis Carroll. Pesquise sobre as obras dele. Se eu contar o nome do livro, estarei dando um spoiler danado.
Existem trocentos clichês por aí: o do personagem coitadinho que ganha poderes e vira herói (Harry Potter, Homem-Aranha, O Máskara…); o do protagonista que encontra seu sósia malvado; o do personagem que descobre que vai morrer e parte para atos edificantes até descobrir que não vai morrer; o do mocinho que é acusado de um crime que não cometeu e tem que fugir de meio mundo até provar sua inocência; o do herói que descobre quem é o culpado pelo crime, e antes de morrer, o criminoso confesso explica suas motivações e seus planos, dando chance para o herói se safar; o casal que começa a história se odiando e acaba se apaixonando.
Clichê tem de montão por aí. Não se preocupe em pesquisá-los, porque você tem a vida inteira pela frente e, acredite: qualquer hora você vai esbarrar com eles!
Quer mesmo escrever histórias bacanas? Fuja dessa porcaria.
Por exemplo, colocar seu personagem sofrendo só pra ganhar a simpatia do leitor é um truque muito baixo. Em vez disso, crie um personagem simpático. Ou divertido. Ou inteligente. Vale até fazê-lo dar o troco em quem aprontou com ele.
Outra opção é subverter o clichê. Deixe todo mundo pensar que vai acontecer uma coisa e evite que a “coisa” aconteça. Um sujeito mordido por um vampiro se transforma não num monstro, mas num sanguessuga tímido. O ajudante do vilão que de repente se mostra mais esperto que seu chefe. Um marido machão que acha que manda em casa, sem perceber que a esposa o tem na palma da mão e é ele quem a obedece. As opções são quase infinitas, e a diversão, garantida. Um exemplo de subversão de clichês é minha HQ O Extracurricular Cucaracha. Novamente, não posso falar nada porque senão estraga a surpresa.
E estereótipo?
Aqui temos um assunto bem delicado. De uns anos para cá, percebi que as pessoas estão se transformando em estereótipos ambulantes. Tem-se a impressão de que personagens que víamos em quadrinhos, no cinema, nos comerciais de TV e em novelas decidiram criar três dimensões só para nos assombrar: o roqueiro de cabelo comprido que só se veste de preto com camiseta de banda; a moça masculinizada acima do peso, de cabelo curto e óculos de armação grossa; o adolescente de boné, óculos escuros, camiseta “Xing Ling”, bermuda e tênis; o religioso de cabelo bem curtinho, camisa com gravata, calça social e Bíblia na mão. Alguns desses estereótipos andam em grupos, vestidos exatamente da mesma forma, com algumas variações. Dependendo de onde mora, garanto que você consegue identificar algumas dessas pessoas.
Estereótipos são cansativos e podem gerar a antipatia no seu leitor.
Mais uma vez, o truque consiste em subverter.
Em vez da loira burra, que tal uma mulher muito bonita e muito engraçada? Em vez do atleta fortão que faz bullying nos outros, um sujeito musculoso, bom de briga e nerd? Ou um mocinho nem tão certinho contra um vilão nem tão malvado?
Criar personagens assim é bem divertido. Acredite!
O melhor de tudo é que, quando quebramos os clichês e os estereótipos, sabe o que acontece? Além de sermos originais, a gente contribui pra diminuir os preconceitos.
Até semana que vem!